Sergio Senoux

Project

Pierre Schaeffer: A busca por uma música concreta

A música eletrônica é um fato desde 1948, quando o Concert à bruits, de Pierre Schaeffer, foi transmitido pela Radio France (Radiodifusão Francesa, RDF). Então chefe do departamento de sonoplastia do setor de rádio-teatro da emissora, Schaeffer apresentava ao mundo um concerto sonoro que representava muito mais do que o resultado de seus experimentos musicais.

Mas não apenas um concerto de ruídos... Schaeffer introduziu o uso do sampling - tratamento amostras de áudio - como forma de composição. Variações das velocidades de gravação e reprodução, amostragem, manipulação e edição de sons, reprodução reversa, modulações de intensidade, fade-ins e fade-outs foram algumas das técnicas empregadas na construção de uma nova estética.

A amostragem sonora e até mesmo o turntabilismo têm raizes nas experiências de Schaeffer, considerado o padrinho do sampling. Figura influente na música moderna, ele é responsável por desenvolver técnicas de gravação que revolucionaram o mundo musical. Suas pesquisas serviram de base para criar o conceito sonoro batizado de musique concrète.


História

Pierre Henri Marie Schaeffer nasceu em Nancy, França, no ano de 1910. Formou-se engenheiro de rádiodifusão e tornou-se também escritor, compositor, filósofo, musicólogo, educador e acústico. Filho de músicos (seu pai era violinista e sua mãe cantora), estudou violoncelo no conservatório de Nancy. Desde novo tinha um senso para a pesquisa sonora. Foi incentivado por seus pais a cursar a École Polytechnique e estudou sobre eletricidade e telecomunicações.

Após formar-se em rádiodifusão, Schaeffer tornou-se engenheiro da emissora pública Radiodifusão Francesa (RDF), em Paris. O grande interesse pela área, a influência teórica do futurista Luigi Russolo e a atração por sons gravados para o cinema despertaram no jovem musicólogo um grande desejo pela pesquisa em tecnologia musical.

Schaeffer então convenceu a RDF a lhe permitir o uso de um estúdio da emissora para iniciar seus experimentos, formalmente chamados de pesquisa de ruídos.

Em 1942, Schaeffer fundou o seu próprio estúdio dentro da RDF: o Studio d'Essai, rebatizado mais tarde como Club d'Essai. Nesse estúdio, equipado com mixers, um torno de corte de discos e uma biblioteca de efeitos sonoros, lançou as bases para o que viria a ser musique concrète.

No ano de 1949, Schaeffer conheceu Pierre Henry, compositor de formação clássica com quem passou a dividir experiências musicais. Schaeffer uniu-se a Henry na fundação do Groupe de Recherche de Musique Concrète (GRMC, mais tarde tornando-se GRM), o primeiro estúdio pensado e projetado especificamente para música eletroacústica.

Inovações

Em 10 anos de atividade, Schaeffer e Henry mudaram radicalmente a face da música. Além das inúmeras inovações estéticas, suas invenções alcançaram muito sucesso no campo da técnica. Eles foram responsáveis por introduzir o uso de recursos como a fita magnética por emenda e looping, e o uso do gravador de fita com três pistas.

Criaram também o morfofone (um atraso de 10 cabeças e máquina de loop), o fonógeno (um dispositivo controlado por teclado capaz de repetir loops em várias velocidades), além dos muitos sistemas de amplificação utilizados na experimentação espacial sonora.

Os compositores não estariam mais presos a partituras e notações escritas - sua música poderia existir apenas como gravações.

Arte com ciência

As ideias de Pierre Schaeffer viraram o universo da produção musical de ponta-cabeça. Ao repensar os fundamentos da composição e produção, Schaeffer nos deu uma nova forma de música que unia arte e ciência. A teoria musical passa a ser desafiada a partir desses novos conceitos, onde a escrita dos sons partia do abstrato para o concreto - do conceito de notas para fragmentos de sons reais.

A abordagem de Schaeffer inverteu o processo de composição, partindo da gravação de sons de origem natural ou mecânica para o tratamento das amostras com as técnicas e efeitos de estúdio. Dessa forma, os compositores não estariam mais presos somente a partituras e notações escritas. A música poderiam existir apenas como gravação.

Para Schaeffer, como qualquer som pode ser reaproveitado, as combinações de tímbres, ritmos, instrumentos, vozes e harmonias se tornaram infinitas. Dentro de cada som, por mais trivial que nos pareça - como os ruídos de um trem sobre os trilhos, por exemplo - existe uma veia musical muito rica escondida: fragmentos de ritmos complexos, características tímicas únicas, peculiaridades tonais, texturas estranhas e interessantes.

Segundo Schaeffer, a nossa percepção dessas qualidades sempre é prejudicada por associações prévias que fazemos do que cada barulho representa. O truque da música concreta é o de esconder tais associações e trazer as qualidades musicais desses sons para o primeiro plano.

O novo normal da música


Ativista anti-nuclear do pós-guerra (II Guerra Mundial), Schaeffer era um fã declarado das composições da chamada Segunda Escola de Viena, dotadas de experiência criativa atonal e dodecafônica (sistema de organização em séries de alturas musicais que trata os 12 semitons da escala cromática como iguais, criado pelo músico erudito Arnold Schoenberg em meados de 1930).

Schaeffer vislumbrava um modelo musical fora do normal. Em uma abordagem livre, defendia o princípio do fazer pela escuta. Refutava o uso de síntese sonora, algo do qual resistiu até o início dos anos de 1970, com a adoção de um sintetizador Coupigny - uma máquina específica com controles globais de parâmetros e gerador de eventos sonoros, projetada por François Coupigny para uso na música concreta gaulesa.

Schaeffer desenvolveu uma estética centrada no uso do som como principal recurso composicional. A estética também enfatizou a importância do jogo (jeu) na prática da composição sonora. O uso que Schaeffer faz da palavra jeu, do verbo jouer, carrega o mesmo duplo significado que o verbo inglês play: "divertir-se interagindo com o ambiente", bem como "operar um instrumento musical". Pierre Henry

As teorias de Schaeffer contrastavam com a corrente alemã da Electronische Musik, dos também visionários Karlheinz Stockhausen, Herbert Eimert e Ernst Krenek. O trio da rádio de Colônia defendia uma composição desprendida dos sons do mundo real, com base no serialismo (método de organização do material musical em séries ordenadas) e uso dos controles de parâmetros como pitch, duração, timbre e intensidade, dentre outros.

Certamente, a contribuição de Schaeffer trouxe grande impacto ao cenário da música na segunda metade do século XX. Seu legado influencia e desafia produtores e engenheiros até os dias atuais. Hits e discos inteiros foram produzidos apenas utilizando as bases do sampling. Certamente outras formas de arte ganharam muito com o uso de tais técnicas - especialmente o cinema. A própria concepção da House Music e do Techno também se aproveitaram bastante do que Schaeffer ensinou.

Nos anos 40, Schaeffer inventou o sample, o groove travado - em outras palavras, o loop [...] Foi Schaeffer quem fez experiências com sons distorcidos, jogando-os para trás, acelerando-os e diminuindo a velocidade. Foi ele quem inventou toda a forma como a música é feita hoje em dia.Jean Michel Jarre

Wikipedia, Fact Magazine, 120Years.net, Britannica, Portal Concertino, Revista Dicta & Contradicta.

Freebie: Ondas de ciclo único no Octatrack


Entre sons e ilustrações, o produtor musical Christopher Kaye compartilha dicas e conteúdos sonoros de suas pesquisas no blog Lot's Of Sound e no canal Void Vertex.

Kaye desenhou 100 formas de onda de cíclo único e deixou um link no blog para download. No vídeo acima, ele mostra como utiliza suas ondas no sintetizador Elektron OCTATRACK. Tais ondas podem ser importadas para qualquer synth ou emulador.

Um uso bem simples, porém muito interessante, consiste em carregar o arquivo da forma de onda em um synth virtual que trabalhe com waveforms, como o Arturia Pigments, o Xfer Records Serum ou o NI Massive.

Mas, se você quer ir direto ao ponto e explorar a forma de onda de um jeito bem experimental, a dica é jogar a amostra no Simpler do Ableton Live. Além de ver o formato da onda, podemos cortá-la e produzir um som tonal a partir da programação de um loop do sample.

Clique aqui e veja o post original no blog, com o link para download das 100 formas de onda.

Links

Veja o trabalho de Kaye no blog e no Youtube:


Sinestesia

Kaye descreve seu talento como sinestesia, uma mistura expontânea de sentidos que relaciona sensações de caráter diverso. Algo como ver ou desenhar um som no papel, comportamento que o produtor assume fazer desde sua infância.

Frieder Nake: Computer-Art é algo que não deveria existir


Um título tanto quanto provocativo, uma reflexão e uma direção de pensamento. Foi dessa forma que um dos precursores nas artes digitais conseguiu mexer com a cabeça de vários artistas, escritores, músicos e designers que estavam prontos para abraçarem a nova onda no domínio informacional.

Frieder Nake, alemão nascido em Stuttgart (1938), é reconhecido como pioneiro na arte computacional. Matemático e cientista da computação formado pela Universidade de Stuttgart, ficou conhecido internacionalmente por sua contribuição para as primeiras manifestações nesse novo campo que une arte e tecnologia em um único caminho evolutivo.

Membro da Computer Arts Society, Nake propôs um olhar sobre o uso do digital para produção artística em um artigo publicado no Bulletin, em outubro de 1971 (edição 18). Para a época, a influência algorítmica era vista com um certo desconforto.

A discussão levantada por Nake tinha contornos polêmicos, porém elucidativos. Suas ideias refutavam uma exploração, digamos, mais mercadológica do digital como construtor do conceito estético.

A mensagem de Nake é um despertar para o fato de que o computador era apenas um meio de desenvolvimento da expressão da arte e um instrumento que permite explorar, investigar melhor os caminhos da criação artística.

AMEAÇA À ARTE OU O PROGRESSO?

O artista seria menos artista se não dominasse ou não tivesse acesso a um maquinário caro como o daquela época? No entendimento a respeito do artigo, posso dizer que Nake despertara o consciente coletivo, refutando a pergunta - expressa que isso não era a reflexão a ser feita.

Aponta um caminho para o pensamento de que o meio era apenas uma forma de desenvolvimento. O que mais importa em seu argumento é a informação estética em si e o seu real background (motivo).

O matemático defendia que o computador não deveria ser usado para criar outra moda artística. Mas sim, usado para pensar todas as formas estéticas já existentes e como elas poderiam se desenvolver. Para ele, fazer arte no computador não era o objetivo. Em 2004, chegou a mencionar que "os desenhos não eram empolgantes, mas o princípio envolvido era".

Nake propôs quatro questionamentos que, juntos, podem representar um chamado para revermos a importância de todo o padrão estético construído até então. Propôs refletirmos como que projetando o futuro e a transformação de todos os signos e formas de comunicação já utilizados.

Para chegar a este ponto, ele trouxe um pensamento do quão efêmera é a moda ano após ano, citando o estilismo e a industria automobilística como exemplos.

De fato, o que houve depois disso foram caminhos paralelos. Ao mesmo tempo em que surgiu uma verdadeira estética algorítmica (marcada por assinaturas e épocas, como os "8bit" ou "Matrix", diga-se), a evolução computacional - e aqui devemos trazer as evoluções tanto em hardware quanto em linguagens de programação - nos trouxe uma ampla capacidade de processamento e com isso a produção de obras de todos os padrões estéticos possíveis e imagináveis por meio do digital.

ARTISTA, MATEMÁTICO, PESQUISADOR E PROFESSOR

A trajetória de Frieder Nake na arte digital teve início em 1963, e seus desenhos foram exibidos pela primeira vez em novembro de 1965, no Galerie Wendelin Niedlich em Stuttgart. Sua grande influência artística encontra-se na obra Information Aesthetics, de Max Bense.

Suas principais fases de trabalho são identificadas pela coleção de programas compArt ER56 (1963-65), Walk-through-raster (1966), Matrix multiplation (1967/68) e Generative esthetics I (1968/69).

Frieder Nake é professor titular de ciência da computação na Universidade de Bremen, Alemanha, desde 1972. Também leciona na Universidade das Artes de Bremen, desde 2005. Suas atividades de ensino e pesquisa são em computação gráfica, mídia digital, arte computacional, design de sistemas interativos, semiótica computacional e teoria geral da computação.

Nake esteve representado em todas as importantes exposições internacionais de arte computacional. Tem publições em todas as áreas nas quais atua, em especial suas criações geradas por computador. No artigo de 1971 decretou que não faria mais arte digital, porém retomou essa atividade em 1980.


The Pixel Painter e a realização do que sonhamos fazer


Este vídeo foi divulgado quando o Hal Lasko tinha seus 97 anos. Muito do que me chamou a atenção vai além do talento e a criatividade: a perseverança em superar a barreira imposta por um problema em sua visão.

O documentário The Pixel Painter fez "vovô Hal" ser conhecido em todo o mundo por seus quadros impressionantes, pintados pixel a pixel no Microsoft Paint. Seus desenhos são descritos como uma mistura de técnicas de pontilhismo e arte em 8-bit.

Hal faleceu em 2014 a poucos dias de completar 99. Talentoso, teve sua vida dedicada ao grafismo e às artes visuais. Quando jovem, começou como designer gráfico e desenhava mapas para as Forças Armadas dos Estados Unidos.

Tipógrafo profissional, Lasko aposentou-se na década de 1970 e a partir de então passava seu tempo em casa criando novas pinturas para satisfazer seu desejo de expressão artística.

Visão comprometida

O avanço da idade tornava a prática da pintura cada vez mais difícil. Hal sofrera de degeneração macular úmida, uma doença ocular crônica relacionada à idade e que limitou severamente o centro de seu campo de visão.

No aniversário de 85 anos, "vô" ganhou de presente um computador, que passou a ser o seu aliado nas artes graças ao Paint. Na tela deste editor de imagens, vovô Hal criou verdadeiras obras, com amor e (muita) paciência.


Mesmo acometido pela deficiência visual, vovô Lasko não permitiu que o problema lhe fosse um obstáculo. Tornou-se exemplo para aqueles que pensam em desistir no meio da trilha, antes de ver que é possível fazer o que sonhamos fazer.

Música e trabalho, por Paulo Anhaia


Música primeiro, marketing depois. Nas palavras do experiente produtor musical Paulo Anhaia, lições de postura, respeito e profissionalismo.